A forte valorização nos preços dos imóveis causa certo
receio nos brasileiros, que temem por uma bolha no setor imobiliário que
poderia estourar a qualquer momento, como ocorreu nos Estados Unidos em
2008. Na última terça-feira, o Sindicato da Habitação de São Paulo
(Secovi-SP) apresentou uma pesquisa que mostra que o mercado de imóveis
novos em São Paulo registrou queda de 49,1% de suas vendas em fevereiro,
passando de 1.927, em 2013, para 981 unidades vendidas no segundo mês
deste ano, o que já deixou alguns analistas preocupados.
Ao mesmo tempo, com a queda das vendas de imóveis novos, os
anúncios e promoções começam a pipocar em sites, redes sociais,
comerciais televisivos, além de jornais e revistas. Todo esse apelo das
empresas de construção e de consultoras imobiliárias pode levar os
consumidores a ficar tentados a comprar, achando que estão fazendo um
grande negócio, olhando os descontos e a forte alta dos preços dos
imóveis no passado. Mas pode não ser tão bom assim.
Quanto vale o imóvel
O professor do Ibmec-RJ e gestor da Simplific, Alexandre
Espírito Santo, que não acredita que haja uma bolha como a dos EUA no
mercado imobiliário brasileiro, recomenda cautela aos compradores,
apesar dos descontos e de eventuais quedas nos preços. “Temos que ver se
os preços já não estariam perto dos ‘valuations’ (valor justo) deles”,
disse.
Para o professor, “a ‘bolha’ do setor imobiliário brasileiro
vai murchar aos poucos, e não estourar como lá fora”. O que parece
estar começando a acontecer, com a queda nas vendas e a desaceleração
dos preços registradas pelo índice FipeZap e pelo Secovi.
Na opinião de Espírito Santo, podemos definir uma bolha
imobiliária de duas formas. A primeira, é a de preços muito acima do
“valuation”, ou seja, do quanto o imóvel deveria valer por algum tempo. A
segunda, é a de pessoas estarem comprando ativos por conta de um
“oba-oba”, levadas pelo momento e pela expectativa de um ganho muito
maior no futuro, o que não parece ainda ser o caso brasileiro.
Simulação
Quem quer comprar tem antes que fazer as contas, tem que se
planejar para ver se realmente vale a pena comprar o imóvel em vez de
alugá-lo, afirma Espírito Santo.
Ele sugere que o consumidor descubra quanto custa o
apartamento ou a casa em questão e quanto ela renderia de aluguel para
ele. “Há muitos anos, conseguíamos alugar o imóvel por uma quantia em
torno de 1% do valor da propriedade ao mês, mas hoje esse percentual
caiu para 0,3%, 0,4%”, lembra.
Ao comprar um imóvel, é preciso ter em mente o quanto se
quer gastar. “Por exemplo, R$ 1 milhão? Quanto eu conseguiria de
aluguel? R$ 4 mil por mês? Isso dá 0,4% mensal”, explica. Assim, o
consumidor deve ver em quanto tempo terá o chamado “pay back”, ou seja, o
tempo para se ter o retorno do preço pago pelo imóvel, nesse caso de 21
anos. “É barato? Não é! Abaixo de 20 anos eu até pensaria, 15 anos, por
exemplo. Mas perto ou acima de 20 anos está caro”, avalia.
Valorização deve ser menor
Outra forma de avaliar a compra de um imóvel seria contar,
além do retorno do aluguel, com a valorização de mercado da propriedade.
Mas, depois da forte alta dos preços nos últimos anos, a valorização
não deve ser tão grande.
O problema, diz Espírito Santo, é que as pessoas têm a
percepção errônea de que, se subiu tanto nos últimos anos, o preço vai
continuar a subir mais. Mas não há garantia de que a alta vai continuar,
e até o contrário pode acontecer. “É uma inocência financeira que,
muitas vezes, leva o comprador a se empolgar e cair na facilidade do
crédito”. E é isso que mais preocupa o professor.
‘Não há bolha, mas não está nada barato’.
Os preços subiram muito nos últimos anos porque o governo
passou a incentivar a compra de imóveis com a facilitação ao crédito. Os
bancos também aumentaram a oferta de empréstimos, diante do cenário
mais estável da economia e da queda dos juros e das regras mais claras
para retomada do imóvel em caso de não pagamento.
Com mais dinheiro e mais compradores, os preços dos imóveis
dispararam. De acordo com o Banco Central, nos últimos cinco anos os
imóveis residenciais tiveram valorização de 155%.
O preço do metro quadrado anunciado para venda no Brasil
cresceu 13,7% em 2013, segundo o índice FipeZap. Mas, em março deste
ano, a valorização já foi menor do que a inflação oficial, o,64% em
relação a fevereiro, ante 0,84% do Índice Nacional de Preços ao
Consumidor Amplo (IPCA), referência nas metas de inflação do governo.
Além disso, o aumento de preço acumulado em 12 meses vem recuando, de
13,74% em dezembro para 12,9% em março.
Enquanto isso, o volume de financiamentos imobiliários com
recursos do Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE) continua
em expansão. Subiu 32% em 2013 em relação a 2012, de acordo com a
Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança
(Abecip) – totalizando R$ 109,2 bilhões.
Alugar em vez de comprar
Espírito Santo sugere que quem puder adiar a compra e passar
a alugar, é melhor. “Em termos de ‘valuations’, os preços encontram-se
em um patamar salgado. Nada muito convidativo, apesar do desaquecimento,
não está nada barato”, diz. “A menos que seja um sonho a ser realizado,
uma extrema necessidade ou que seja uma barganha”, afirma. E, mesmo
nesses casos, a ordem é negociar, pois o poder do comprador hoje é
maior.
Espírito Santo acredita que a tendência dos preços no
mercado imobiliário é de queda contínua. “O mercado estava precisando de
algum ajuste, muitas pessoas compraram, não conseguiram pagar o
financiamento e agora querem passar o imóvel adiante, alguns até com
desconto”, observa.
Bolha que murcha e não explode
O professor não acredita, porém, que os preços aqui vão
despencar como ocorreu nos Estados Unidos após o estouro da bolha do
subprime, como eram chamados os empréstimos imobiliários malfeitos pelos
bancos americanos. Para ele, os preços podem cair e passar por uma
correção, mas é como se tivéssemos uma bolha que não estourasse, e, sim,
murchasse. O fato é que há déficit habitacional no Brasil, o que
sustenta a procura por imóveis por muito tempo ainda, afirma.
Selic.
Ao mesmo tempo em que os preços dos imóveis se estabilizaram
ou começam a cair, as opções para quem tem dinheiro para aplicar
melhoraram com a alta da taxa de juros. “Hoje, o ideal seria aplicar o
dinheiro na Selic e alugar um imóvel”, diz Espírito Santo. “O aluguel
sairia por 0,3%, 0,4% ao mês, ao mesmo tempo em que o consumidor
ganharia 0,8% com a Selic”, observa.
Imagina depois da Copa
O maior evento do ano, a Copa do Mundo, deve criar uma
grande procura por imóveis para alugar, o chamado aluguel temporário,
que vai atender à demanda de jornalistas, turistas, equipes e comissões
dos times e países e membros da FIFA, ou daqueles que não encontrarem
vagas em hotéis. “Mas não podemos nos iludir por causa da Copa”, disse o
professor.
Para ele, vai chover oferta de aluguel depois que o evento
terminar. “Com isso, o preço dos imóveis será afetado, e a tendência é
de que não haja alta daqui para frente, acredito que nem em 2015″,
alerta. “É possível que haja até uma tendência de queda [dos preços]”,
conclui.
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